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arrow_back Aula 07 - Controle de vazão

Válvulas de Controle de Vazão

Toda malha de controle de processos contém um elemento final de controle, o dispositivo pelo qual permite que uma variável de processo seja manipulada. Para a maioria dos processos industriais, os elementos finais de controle ajustam a vazão de materiais e, indiretamente, as taxas de transferência de energia para o processo (GARCIA, 2013).

O método mais simples e mais usado para manipular fluidos nas indústrias de processos é empregar uma válvula de controle, que são os elementos atuadores mais comuns. Elas atuam manipulando a vazão de algum tipo de fluido, como gás, água, produtos químicos ou vapor, com o objetivo de compensar alguma perturbação e manter as variáveis de processo o mais próximo possível do valor desejado

Nota: Como esse material não está direcionado para um curso de instrumentação, sugerimos leituras adicionais sobre válvulas de controle, pois existem alguns tipos de válvulas com diferentes características e o que será abordado aqui é algo mais comum. Uma boa leitura para aprofundamento está em CONTROL (1998). Nessa leitura, você encontrará mais detalhes sobre tipos de válvula, dimensionamento, características dinâmicas, etc. Outra sugestão é uma primeira leitura do autor Artur Cardozo Mathias - Controle de Fluxo Através de Válvulas Manuais e Automáticas, Válvulas no processo de fabricação de celulose e papel e em seu livro Válvulas: Industriais, Segurança e Controle, Artliber Editora.

Tais válvulas tipicamente utilizam algum tipo de acionador mecânico para mover o obturador da válvula em sua sede, abrindo ou fechando a área para a passagem do fluido. O acionador mecânico pode ser um motor de corrente contínua, um motor de passo, um atuador eletromagnético ou ainda um atuador pneumático constituído por um diafragma operando pneumaticamente e que move a haste da válvula contra a força oposta de uma mola fixa, sendo este último o mais comum e o mais barato (GARCIA, 2013). Na Figura 4, tem-se as partes constituintes de uma válvula de controle pneumática típica com diafragma.

Válvula de controle pneumática do tipo globo.

A válvula tem a função de regular a taxa de vazão do fluido que trafega por seu corpo, conforme a posição de sua haste ou disco é variada, de acordo com a força aplicada por seu atuador. Para tanto, a válvula não deve possuir nenhuma espécie de vazamento, deve ter as dimensões necessárias e suficientes para a demanda de fluido imposta a ela, tem que ser capaz de lidar com as possíveis características erosivas, corrosivas e térmicas do processo (PAIOLA, 2008).

Resumidamente: As válvulas de controle de vazão são equipamentos que possibilitam variar a área da seção transversal da corrente a qual estão ligadas. Essa variação provoca a variação de vazão desejada.

Ainda em Garcia (2013), é enfatizado que apesar do crescente uso de válvulas motorizadas, a maioria das aplicações de controle de processos utiliza válvulas de controle pneumáticas. Como é muito comum ter-seo uso de controladores eletrônicos analógicos ou digitais controlando válvulas pneumáticas, pode ser necessário introduzir na malha um conversor I/P (corrente/pressão), que converte corrente (sinal proveniente do controlador) para pressão (sinal proveniente de um compressor para alimentação da válvula), tipicamente 4-20 mA para 3-15 Psi, o qual é normalmente assumido com característica linear e dinâmica desprezível (muito rápido), resultando em uma função que meramente consiste em um ganho estacionário $K_{IP}$:

$$ K_{IP} = \frac{\Delta_{P}}{\Delta_{M}} = \frac{(15 - 3)Psi}{(20 - 4)mA} = \frac{12Psi}{16mA} = 0.75 \frac{Psi}{mA} $$

onde:

ΔP: faixa de variação de saída do conversor I/P (3-15 Psi).

ΔM: faixa de variação do sinal de entrada do conversor I/P (4-20 mA), correspondente à saída do controlador.

As Figuras 5 e 6 ilustram, de maneira simplificada, os diagramas do sistema de controle de vazão típicos. Aqui a vazão será controlada por meio de um controlador PI paralelo clássico (Flow controller), conectado a uma válvula de controle.

Diagrama esquemático da malha de vazão.
Diagrama de blocos simplificado da malha de controle de vazão.

A Figura 6 mostra o diagrama de blocos de um circuito de controle de fluxo de processos com atuação da válvula de controle pneumática (elemento de controle final). O controlador no circuito produz uma saída como uma função do erro a partir da diferença entre a referência (SP) e o valor medido da vazão (PV). A saída do controlador (sinal elétrico) será alterada (conversor I/P) de forma a alimentar a válvula de controle pneumática. A Figura 5 exibe o diagrama esquemático para o circuito de controle de fluxo. A posição da haste (Stem) da válvula de controle regula o fluxo e a variável manipulada MV na Figura 6 é a posição em que se encontra a haste.

Nota: Em controle de processos todos os valores das variáveis, tais como: SP, e(t), OP, MV e PV da Figura 6 são geralmente normalizadas na faixa de 0% a 100% dos valores medidos. Sendo assim, como o sinal do controlador OP normalmente corresponde a 4-20 mA, então 4 mA corresponde a 0% e 20 mA a 100% da faixa, e assim por diante. Portanto, a referência SP deve ser inserida também em porcentagem, por exemplo, pode ser solicitada uma vazão de 70% da capacidade máxima do processo.

Em vez de possuir apenas um atuador, as válvulas pneumáticas de controle podem ser equipadas com um posicionador, um tipo de dispositivo de realimentação mecânica que mede a posição real da haste da válvula, compara-a com a posição desejada e ajusta a pressão de ar para a válvula, de acordo com essa diferença (GARCIA, 2013). Esse dispositivo se torna importante, pois na indústria existem válvulas que operam em malha aberta, ou seja, não há um controlador dedicado para corrigir a posição da haste. Em alguns casos o posicionador nada mais é do que um controlador tradicional PID acoplado a uma válvula de controle.

Nota: Na Figura 5 o controlador (no nosso caso o PI) é dedicado para corrigir a vazão da malha (não se tem informação da posição em que se encontra a haste da válvula). Para contornar esse problema, em determinadas malhas podem existir os posicionadores, controladores dedicados para operar a posição da haste da válvula (pode ser desejado apenas o controle de posição da haste e indiretamente tem-se o controle de vazão). Como veremos mais adiante, pode existir também na malha de controle o controlador para a vazão do processo e o posicionador para operar a posição da haste da válvula, ambos trabalhando em conjunto.

Problemas nas Válvulas de Controle

Em grande parte, o desempenho das malhas de controle está relacionado com o adequado funcionamento das válvulas de controle, elementos comuns nos processos industriais (elementos finais). Os principais problemas em válvulas de controle são:

Atrito Estático

O atrito estático é um fenômeno muito comum em atuadores com partes móveis. Como consequência, qualquer processo que utilize esses elementos estará sujeito a uma redução do desempenho na malha de controle. Um equipamento de alta qualidade e bom estado de conservação apresenta baixo atrito, portanto não prejudica o controle em malha fechada. Porém, a tendência ao longo dos anos é o aumento do atrito devido ao desgaste das peças, implicando em perda de produtividade, decréscimo na qualidade do produto ou aumento do custo de produção. Na literatura, o termo agarramento é usado para esta não linearidade.

Backlash (folga)

Movimento relativo que ocorre entre as partes móveis de um sistema mecânico, gerado pela folga entre essas partes, tipicamente quando o sentido do movimento sofre mudança.

Nota: Por sentido de movimento sofrer mudança, entenda a haste da válvula subindo e depois solicitada para descer (houve mudança no sentido do movimento).

Histerese

Propriedade de um elemento que é evidenciada pelo valor da saída para uma excursão da entrada, em consequência da direção da excursão da entrada. Em outras palavras a trajetória da saída do sistema para uma determinada excursão da entrada é diferente quando essa entrada é crescente ou decrescente.

Dead Band (banda morta)

Faixa de valores em que um sinal de entrada pode ser variado, com reversão de direção, sem iniciar uma mudança observável no sinal de saída. É expresso em porcentagem da largura do sinal de entrada. A banda morta possui relações distintas e separadas de entrada-saída para sinais crescentes e decrescentes.

Dead Zone (zona morta)

Faixa pré-determinada da entrada na qual a saída permanece inalterada, independente da mudança de direção do sinal de entrada. Portanto, existe somente uma relação de entrada-saída, independentemente se os sinais forem crescentes ou decrescentes.

Saturação

Em malhas de controle que possuem válvulas é interessante utilizar um “bloco” saturação em sua entrada, justamente para o caso de o controlador requerer mais ação do que o atuador é capaz de disponibilizar. Esse tipo de característica pode levar o processo a atingir restrições.

Agarramento

Baseados nas definições da ANSI para histerese, dead band, dead zone e backlash, os autores Choudhury et al. (2008) definiram uma proposta para a definição do agarramento, como segue:

Propriedade de um elemento de tal forma que sua movimentação suave, em resposta a uma entrada variável, seja precedida por uma parte estática (banda morta mais banda de agarramento) seguida por um salto abrupto repentino, chamado slip-jump. O slip-jump é expresso como uma porcentagem da faixa de saída. Sua origem em um sistema mecânico é o atrito estático, o qual excede o atrito dinâmico (CHOUDHURY et al., 2008, p. 233).

O agarramento pode ocasionar oscilações em forma periódica, conhecido como ciclos limites. A variabilidade faz com que as variáveis do processo extrapolem seus limites de operação, segurança e eficiência. Desta forma, há um consumo excessivo de energia, o produto não obedece às especificações estabelecidas, podem acontecer paradas na operação do processo e não se chegar a um ponto ótimo de rentabilidade.

A correta manutenção dos equipamentos é a melhor atitude a ser tomada, mas segundo Srinivasan e Rengaswamy (2005), as paradas programadas de uma planta acontecem tipicamente entre seis meses a três anos de operação. Sendo assim, há períodos em que uma válvula com problemas deve permanecer operando, o que afeta diretamente o consumo de energia e a qualidade do produto final. Embora não sejam abordadas, existem estratégias para compensação do agarramento que são bastante úteis nesses casos, pois podem minimizar esses problemas até que numa próxima parada programada a manutenção aconteça.

Para permitir a passagem da haste da válvula para dentro do seu corpo (ver Figura 4), existe um orifício no mesmo, normalmente na parte superior. Portanto, para impedir que o fluido do processo saia por esse orifício, são inseridos anéis de vedação, também chamados de gaxetas. Estes elementos estão em contato com a haste, gerando, portanto, atrito entre os dois (SILVA, 2013).

Assim, o atrito estático (static friction) é uma resistência ao início do movimento, normalmente medida como a diferença entre as forças necessárias para superar o atrito estático ao se inverter o sentido de movimento da haste da válvula. Dessa forma, uma característica marcante desta não linearidade é a ocorrência do slip-jump.

O atrito pode ser estático ou dinâmico. O atrito estático é a força que deverá ser superada para que seja iniciado um movimento relativo entre duas superfícies. Uma vez que a barreira do atrito estático seja vencida e que o movimento seja iniciado, o atrito dinâmico passa a atuar.

O fenômeno descrito (agarramento) pode ser melhor explicado pelo comportamento entrada-saída de uma válvula com agarramento ilustrado na Figura 7, conhecido como assinatura da válvula. Para se obter a curva de assinatura de uma válvula de controle é necessária a aplicação de sinais específicos (em malha aberta - apenas a válvula) ao seu atuador (na entrada da válvula) ou conversor I/P, tais sinais podem ser triangulares (mais comuns) ou trapezoidais. Com isso, plota-se a posição da haste (MV) em função do sinal de entrada aplicado. Note que para esse teste de obtenção da assinatura, a válvula deve possuir algum equipamento que disponibilize a posição atual/real (em cada instante) da haste.

Sem agarramento, a haste da válvula se move ao longo da linha traço-pontilhada passando pela origem. Qualquer valor de saída do controlador (OP) resultaria no mesmo valor de mudança da variável manipulada (posição da haste da válvula - MV). No entanto, para uma válvula que “agarra”, componentes de atrito estático e dinâmico devem ser levados em conta. O comportamento de entrada-saída pode ser descrito por quatro componentes: banda morta, banda de agarramento, salto do agarramento (slip-jump - J) e fase móvel.

Curva de assinatura padrão de uma válvula sofrendo de agarramento.

Uma análise da Figura 7 foi retirada de Almeida (2015), como segue: considere que no ponto A a haste da válvula está parada e houve reversão no sentido de movimento, MV é constante com o tempo à medida que a válvula é presa pela presença da força de atrito estático (o sinal de controle aumenta sem que haja variação/movimento na posição da haste da válvula). A faixa de banda morta (AB) deve-se à presença do atrito de Coulomb, uma força constante que atua no sentido oposto ao do movimento. O ponto BC corresponde à banda de agarramento (J), e percebe-se que no ponto C, MV muda abruptamente (salto do agarramento - J), resultado do desbloqueio da válvula pela força externa aplicada e, logo após, MV varia gradualmente (fase de movimento) sendo que há apenas a oposição da força de atrito dinâmica. Quando a velocidade da haste da válvula está muito baixa a mesma volta a “agarrar”, neste caso, não ocorrendo inversão no sentido de movimento só será preciso superar a banda de agarramento. A faixa formada pela banda morta mais a banda de agarramento será referenciada como S.

No caso de ocorrência de agarramento, a variável manipulada (MV) apresenta um comportamento temporal oscilatório. Devido ao pulo que o atuador da válvula (haste) precisa dar para vencê-lo. De acordo com Cuadros (2011), esta tendência do comportamento da variável manipulada é também propagada à variável de processo e é desta forma que o agarramento contribui com a variabilidade do processo e, consequentemente, com a perda de desempenho da malha de controle.

Nota: A causa das oscilações na saída do processo é efeito do slip-jump, apenas com a presença da banda morta na válvula de controle o próprio controlador do processo é capaz de compensar essa não linearidade.

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