1. Chutes e incertezas

Antes de prosseguir, pense por um momento na palavra chute. Até agora ela foi utilizada no sentido literal, mas como seria no sentido figurativo? Quando você diz, por exemplo “Irei chutar algumas questões da prova”, quer dizer que você vai escolher uma opção que você acredita ser a melhor, mesmo que não seja necessariamente verdade. Pois é, para se ter uma ideia, hoje existem técnicas para isso. Como assim? Estudar para chutar? Foi-se o tempo em que chutar era somente uma forma de não entregar uma prova com questão em branco.

Se você vai adivinhar, então está falando de incerteza. Praticamente todos os jogos (há algumas exceções) possuem incertezas embutidas nas suas mecânicas. Em muitos casos, é ela que permite aumentar a jogabilidade, por exemplo, de um nível em um jogo. Como também, entre outros fatores, permite ao jogador uma certa tensão positiva ou apreensão por eventos inesperados e comportamentos imprevisíveis. A incerteza é, portanto, um mecanismo essencial no design de jogos e os desenvolvedores, incluindo você, precisam saber como modelá-la.

Você já deve ter visto a seguinte situação: quando o árbitro de futebol chama os dois capitães para o meio do gramado e decide o lado do campo em um "cara ou coroa". Pois é, a expressão é utilizada, na maioria das vezes, para a escolha de alguma coisa que tenha duas possibilidades (ou isso ou aquilo). Ou seja, existe a probabilidade de um dos times perder a posse da bola para iniciar o jogo. Você acabou de usar o termo cujo conceito começou a ser usado no século XVI para modelar incertezas.

Curiosidade

Cara ou coroa já era! Árbitros personalizam moedas e dão brinde aos atletas…

Confira aqui

Probabilidade é uma medida ou fator potencial de algo acontecer entre todas as possíveis opções. Essa é uma definição simples, mas bastante rica porque envolve dois outros conceitos que precisam também ser modelados: quando um evento ocorre e todas as opções possíveis de eventos.

Voltando à situação da moeda, quero, por exemplo, saber qual a probabilidade de tirar “cara” ao lançá-la para o alto. Como a moeda possui 2 lados, ao lançá-la haverá um total de 2 possíveis resultados (todas as opções possíveis de eventos). Assim, a probabilidade, representada pela letra P, de “cara” ocorrer é de:

$$ P = \frac{evento \space específico}{todas \space opções \space de \space eventos \space possíveis} = \frac{1}{2} = 0.5 $$

A probabilidade de sair “cara” é, portanto, de 0.5. Como o número de eventos específicos será sempre menor ou igual ao número de todos os eventos possíveis, o valor de uma probabilidade estará sempre entre 0 e 1. Para simplificar a representação, usa-se então um valor em percentual, ou seja, um valor que dividido por 100 resulta no valor da probabilidade. No caso da moeda, a probabilidade é de 50%. Ótimo! Você já sabe modelar incertezas! Basta definir, para cada evento específico, um valor entre 0 e 1, que define a probabilidade de o evento ocorrer dentre todas as possibilidades possíveis.

Mas existem algumas restrições. Não se pode simplesmente dar qualquer valor entre 0 e 1 a todas as possibilidades. Não é possível que um dos lados de uma moeda tenha 90% de chance de sair após seu lançamento. Haveria algo incoerente aí. A soma das probabilidades de todos os eventos possíveis deve ser 1 (ou 100%).

Bom… mas onde esses conceitos entram no jogo?

Primeiro, comece ensinando o jogador a dar chutes (no sentido literal).

Depois, ensine-o a escolher em qual canto da trave ele chutará. Em seguida, para promover as incertezas das quais você viu aqui, defina as probabilidades para onde ele chutará.

Havendo chutes em direção à trave, você precisará de um goleiro para defender o gol. Da mesma forma, o goleiro pode escolher aleatoriamente um lado para pular no momento do chute, ou seja, ter uma probabilidade de pulo para cada um dos lados. Mas será que ele não pode aprender para onde o jogador vai chutar? Se o jogador tiver uma tendência (ou maior probabilidade) para chutar no lado direito, será que o goleiro não pode se adaptar a isso? Você verá como fazê-lo se adaptar, aprendendo as tendências em função dos eventos que ocorrem.

Por fim, você irá usar o conceito de Probabilidade visto anteriormente para também modelar os erros nos chutes. Sim, claro. A bola nem sempre vai na direção que o jogador quer. Aliás, não me atrevo a desafiar nenhum jogador ou time para não ferir (possivelmente) sua honra de torcedor, mas tem jogador que raramente faz com que a bola vá onde ele quer.

Mas e se você quer gerar um erro no chute, ele será de quanto? Outro ponto, o jogador vai chutar a bola lá nas arquibancadas ou ela vai sair “tirando a tinta” do travessão? Assim, você precisa também de uma forma para modelar valores contínuos, que não sejam simplesmente “à direita” ou “à esquerda”. Para isso, faz-se necessário ter noção sobre curvas de distribuição e como usá-las para definir o erro dos chutes.

Versão 5.3 - Todos os Direitos reservados